Um almoço com Salzburgo aos pés!

Gosto de cozinha de conforto, tal qual as receitas da avó, de gestos demorados e muito amor, apurada em terno lume. Em estando fora, gosto da cozinha local, que um país também se aprende pelo que se come. E volta e meia procuro uma refeição de autor, que, salvo raros e condenáveis dislates, é quando a cozinha se eleva a um patamar superior de criatividade e excelência. Nestes casos a exigência é absoluta, que o preço não é meigo, e quase sempre são restaurantes celebrados com prémios, distinções e outras pomposidades. Apeteceu-me um desses, estrelados, no último almoço desta ida a Salzburgo, ainda por cima com a cidade a meus pés, que o “Glass Garden” fica no alto, na montanha, ali bem perto do Museu de Arte Contemporânea, e a sala refeiçoeira toda ela rasgada em amplas vidraças permite o deslumbre da vista.

Chegar lá só foi o “cabo dos trabalhos”, porque decidi a ir a pé, recusando o carro e esquecendo-me que um “funicular” nos bota lá em cima em “menos de um fósforo”, mas também vale a caminhada e mais os degraus galgados (perdi-lhes a conta) pelo exercício que habitualmente não faço. Tudo compensou o “esforço”, desde o ambiente, simpatia e profissionalismo de quem nos atende até, o mais importante, quanto se apresenta para prova. A começar pelo pão, de mistura, miolo fofo subtilmente perfumado de erva-doce, e côdea estaladiça, a pedir carícia de toda a sorte de manteigas, ali trabalhadas com afinco e sabores, um então perdidamente fumado. Um delicado bonsai traz-nos junto ao tronco uns quantos divertimentos de boca, cortesia do chef, mas é assim mesmo na cozinha de autor, por vezes até exageram, que o que queremos é começar nos pratos escolhidos e eles tardam com tanto paparico. Ainda fomos mimados com um guloso aveludado de cogumelos antes de abrirmos as hostilidades com o que cada um escolheu. O Rui vai sempre para as carnes, desta optou pelos “rilletes” de pato, terminando num peito de pombo com purê de couve-flor. Já eu eu, pasme-se, escolhi duas sugestões vegetarianas: um creme de tomate perfumado de coentros, até aqui nada de transcendente, apesar da sua irrepreensível veludez, mas logo o sabor do caril e do coco acrescentados em perfeita harmonia o elevaram a um outro nível (hei-de tentar um dia destes, que é só acertar nas dosagens e acrescentar-lhe uma “quenelle” de iogurte e nata, ou esta trabalhada com queijo de cabra, que também deve ligar bem) e um taboulé de bulgur, especiado na perfeição, com legumes-bebé e molho de cenoura. Já não havia estômago para sobremesas, mas mesmo assim não resisti a um macarron de limão, de entre o que a caixa de gulodices, apresentada com o café, nos oferecia.

Magnificamente almoçados, repetimos o percurso da ida agora de regresso ao centro histórico, com calma e fruição, pela beleza da floresta e por sabermos que a descer todos os santinhos ajudam!

www.monchstein.at

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