Salada Goucha

Um amável espectador fez o favor de me enviar uma colagem de imagens referentes a programas que fiz em televisão e que há muito havia guardado no mais recôndito da memória. Não tenho por hábito visitar o passado, por isso até que foi divertido fazer este exercício de lembrar datas, episódios e sobretudo pessoas que enriqueceram o meu percurso de vida. Recordo estes sempre com um sorriso e grato pelo que me ensinaram e permitiram.


1) As primeiras imagens dizem respeito à minha estreia em televisão, atrevo-me a dizer como apresentador, independentemente da nítida canastrice. Foi no programa “BOTA DAS SETE LÉGUAS”, um magazine para jovens, feito e apresentado por jovens. Cabia-me digamos que a parte cultural, ligada ao canto, ao teatro e à dança. Já então a Arte me arrebatava. Fico a devê-lo a Maria do Sameiro Souto, na altura sub-directora do departamento de programas infanto-juvenis da RTP, superiormente dirigido por Maria Alberta Menéres. Na altura já era actor e estava em cena no Teatro do Nosso Tempo, ali à Praça José Fontana, frente ao !iceu Camões, com a peça para crianças “A volta do camaleão alface”. Foi no decorrer de uma reportagem para o programa “Bota das Sete Léguas” que a Maria do Sameiro me conheceu e, pelo visto, acreditou que eu levaria jeito.

Lembro-me perfeitamente destas imagens. Era um dia de calor abrasador, apesar das gravações terem decorrido no Parque de Merendas, em Sintra. Todo o país “suava as estopinhas” com temperaturas a ultrapassarem os quarenta graus. Por toda a parte esgotaram-se as cervejas e os gelados. E foi nas “bejecas” que acabámos, mesmo não sendo grande apreciador. Quando o calor aperta, uma estupidamente gelada até que vai!.

2) Segue-se um trecho de “A LOUCA DE CHAILLOT”, uma peça de Jean Girandoux, posta em cena com grande sucesso, em 1967, por Luzia Maria Martins, com a companhia “Teatro Estúdio de Lisboa” que fundou e dirigiu junto com Helena Félix, a inspirada actriz que vemos nas imagens. Estava longe de imaginar que faria parte do elenco, quando, anos depois, a peça foi reposta em televisão, com outros actores no desempenho das diversas personagens, à excepção da protagonista, de novo magistralmente interpretada pela Helena Felix, e sob a encenação da Luzia. Na altura, eu fazia parte da companhia teatral e só isso há-de me levar a escrever em breve, de tão enriquecedores e contraditórios que foram esses anos ali vividos no velho Teatro Vasco Santana, à Feira Popular, o mesmo que, mais tarde, Carlos Cruz transformaria em estúdio de televisão. Desta aventura, recordo, a importância que o teatro ainda tinha na programação televisiva, o trabalho ao lado de queridos colegas como o Amilcar Botica, com quem contraceno, e a criativa equipa de realização da RTP, neste caso fundamentalmente constituída por mulheres e liderada pela Cecília Neto. Quão inspirador e revolucionário que foi.

3) Quando houve quem estranhasse, e legitimamente, a minha presença como jurado no MasterChef Portugal, lembrei, onde me foi oportuno fazê-lo, que foi pela porta da cozinha que entrei, a sério, no mundo da televisão, com programas da minha autoria, como “Gostosuras e Travessuras” e “Sebastião come tudo”, onde uma receita era pretexto para a festa com histórias e canções. Também havia sido durante largos anos crítico de
restauração, em jornais de referência como “0 sete”, “O Jornal” e revistas, como a “Sábado”. Havia-me, porém, esquecido desta série que aqui é recordada: “PORTUGAL DE FACA E GARFO”. Com ela percorri quase todo o país, de norte a sul, escutando o saber dos mais velhos no que diz respeito às receitas e às tradições. Muito do que usei na apreciação das propostas culinárias dos concorrentes a MasterChef, em qualquer uma das edições, e sobretudo nos desafios ligado à cozinha da memória, aprendi nessa série, no terreno, sobretudo com as figuras matriarcais que tanto marcam a nossa cozinha tradicional. Trabalhei, então, sob a batuta do Leonel Rodrigues e com o apoio, a nível da pesquisa e dos textos, do Afonso Praça, referência maior de um jornalismo independente, que não pactuava com o boato, com a intriga ou com a mentira. Outros tempos!

4) Eu a debitar um texto, tendo como cenário as imponentes chaminés da cozinha do Palácio Nacional de Sintra. Era o programa zero, de uma série que pretendia fazer e a qual baptizei “DE MÃO CHEIA”. A ideia era homenagear homens e mulheres ligados à autoria e/ou à história das receitas mais importantes da nossa gastronomia, com particular destaque para a doçaria que, confesso, é o que mais me encanta. Lembro-me que neste programa zero me foquei na vila encantada que tantos celebraram, como Lord Byron, tal como o digo, e nas suas queijadas, tendo dedicado particular atenção às da Sapa, fabrica das mais antigas e na altura nas mãos de uma descendente do seu fundador. A série não se chegou a fazer, mas qual não foi o meu espanto, um dia, estava eu na praia, ao ler, num jornal, a programação de televisão para esse fim de semana, quando verifiquei que o programa estava agendado para emissão! Era um programa zero, editado mas sem genérico, e mesmo assim foi para o ar!

5) As imagens seguintes não têm grande história, dizem respeito a uma apresentação à imprensa da programação da Rádio Renascença, da qual eu faria parte . Não me lembro se alguma vez tive esses tais cinco minutos para dizer o que bem entendesse. Se os tive não foram importantes, de tal modo se me varreram da memória. Tive um programa, sim, com a Teresa Guilherme, que morreu de “morte macaca”. Fomos “despedidos” por “mau comportamento”, mas a história fica para outros escritos.

6) Era o último programa “BOM DIA” feito nos estúdios da RTP em Gaia e assim terminava um período de nove meses, de programas diários, a começarem às sete da manhã e a terminarem às dez. Três horas de informação, debate e entretenimento. A meu lado, a Amélia, a tradutora para língua gestual que nos acompanhou em todos os programas, e o Julio Magalhães, que assim se estreava na condução de um programa com tais requisitos. Foi para mim, também, um desafio ímpar, vinha de uma experiência isolada, de três semanas, a nível da apresentação, o “Porto de Encontro” , também feito no Norte e fui claramente uma arriscada aposta do José Eduardo Moniz, então director da RTP e do Manuel Rocha, na altura director do Centro de Produção do Porto. Estou-lhes eternamente grato, por me terem indicado o caminho que, tantos anos depois, procuro não desmerecer. É que não mais deixei as manhãs da televisão.

7) E o lote de recordações termina com a minha ida aquele que seria o primeiro programa “EU TENHO DOIS AMORES”, apresentado pelo Marco Paulo. O programa era gravado então no teatro do Casino Estoril. Lembro-me de ser também convidada a Tonicha. E de na plateia estar uma das dilectas amigas do cantor: Lili Caneças . Quem lá fosse teria de cantar ou atrever-se a tal, que a tarefa torna-se difícil para quem se revela semitonado, como foi o meu caso. Registo a última frase da quadra que parolei, da autoria da Rosinha, que esse era o jeito que os amigos tinham de tratar a saudosa Rosa Lobato de Faria: “…voar cada vez mais”. Não me canso de o fazer, que a vida só vale enquanto for desafiado.

Maria do Sameiro Souto
Luzia Maria Martins
Helena Félix
Amilcar Botica
Afonso Praça
Rosa Lobato Faria

… já partiram, mas continuam vivos no que tenho de melhor enquanto profissional e cidadão. Os outros, também referidos, continuam a ser um exemplo nas suas áreas, de exigência e qualidade. Obrigado a todos.

16 comentários a “Salada Goucha

  1. Maria celeste

    Manuel eu sou sua admiradora desde o início da sua carreira adoro o Manuel em toda a sua personalidade já lhe disse no Facebook que adorava ter um filho como o Manuel pois é tão adorável a falar da sua Mãe pois é muito amoroso a maneira como fala da Mãe muitos abraços e beijinhos Celeste

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  2. Isabel Belo

    Gostei imenso de ver! De facto o Manuel Luís, é um bom apresentador, adoro ver os seus trabalhos. Continue a presentear-nos! O Manuel Luís, é como se diz! É como o VINHO DO PORTO!!!…
    Beijinhos

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  3. ARMANDA COLARES

    Já morei em Portugal, e uma das muitas lembranças.. é você!! adorava ver seu programa com cristina.

    hoje estou no Brasil, em Manaus Amazonas.

    beijinhos

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  4. Mara Carina Freire de liz dos Santos Simoes

    Boa noite Manuel , gostei muito de ver estas imagens pois so me lembrava da sua ida ao programa do Marco Paulo . Continui a ser o excelente apresentador que é e que eu ademiro e nao perco um unico programa .Beijinhos e tenha um bom fim de semana .

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  5. Sonia Carvalhinho

    Caro Goucha,

    É a única coisa que levamos para sempre dentro de nós, as memórias, os sentimentos dos momentos, e nisso o Manuel é uma pessoa muito rica, não há nada que compare as histórias de vida que teremos para contar, as nossas memórias, nada supera essa riqueza, Parabéns!

    Deixo um beijinho
    Sónia Carvalhinho

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  6. Susana Catarina

    Gostei de vê-lo mas achei-o muito magrinho…. O senhor é um artista! Foi bom saber k o senhor já fez tanta coisa…tudo de bom fique bem!

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    1. admin Autor do artigo

      Boa noite, Maria Odete. Pode seguir o Manuel Luís também no facebook (www.facebook.com/manuelluisgouchatvi) e assim acompanhar todas as novidades, incluíndo as do blogue. Obrigado pelo seu comentário! (admin.)

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  7. Sandra Fernandes

    Sempre ousado, frontal e com um sentido de humor fantástico. E nada como o vinho do Porto que matura e, quanto mais, melhor :-). Sou “fã” da sua personalidade e do seu carácter, pois há quem deixe transparecer aquilo que realmente é. Obrigada por contribuir para a abertura de mentalidades neste país à beira mar plantado…e com poucos horizontes.

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