Aqui há gato(s)!

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Por muito velha que seja esta taça nunca será uma antiguidade, já que não tem qualquer interesse e valor artísticos. É apenas uma velharia curiosa porque levou gatos, não os bichos felpudos (ou não, que sou dos que têm um felino pelado) de que tanto gostamos, mas sim os grampos de metal que faziam com que uma peça rachada ou mesmo quebrada pudesse continuar ao serviço. E foi assim ao vê-la gateada que me lembrei da figura típica do amolador quando este, de quando em vez, se fazia anunciar na baixa de Coimbra, passando os beiços pela gaita, para logo as senhoras descerem à rua com as suas facas e tesouras rombas para serem afiadas, com uma cafeteira, panela ou tacho a pedirem “pingo”, com os guarda-chuvas reclamando varetas novas… E tudo o amolador consertava, prolongando assim a serventia diária de muitas peças. Que os tempos eram de míngua e nada se podia deitar fora. Assim foi com esta taça, apesar de a encontrar agora perdida num depósito de quinquilharia, enquanto decorre este meu alentejanar. Por serem estes tempos de outro conforto não sobra valia para tais cacos, mas as memórias de infância falaram mais alto, por isso fiquei com ela, por “dez réis de mel coado”, trouxe-a para o monte e dei-lhe novo préstimo. Guarda agora as toalhas de mãos, numa das casas de banho, e, como não poderia deixar de ser, com os gatos à mostra. É o que se diz: sete vidas têm os gatos!

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31 comentários a “Aqui há gato(s)!

  1. JORGE DA SILVA

    “Agrafos ” Londres 09 de Março 2017 – Jorge Pincoruja

    Naquele tempo em que ao tempo sobejava tempo, nós tínhamos agrafos.
    Agrafavamos os dias colados uns aos outros num calendário vivo.
    Tudo era como se esperava e se havia inesperados benziam-se as mulheres “Jesus, credão”.
    A bilha era de barro e o tacho também e diziam que a comida tinha mais sabor.

    Depois saído de um arco de fantasia entre o nevoeiro das manhãs e as poeiras da tarde vinha o amolador com a sua gaita de beiços …
    Todos sabiam a que vinha e procurava-se á presa aquela tesoura velha e a faca que estava cega ….
    Era uma visita irregular como os telegramas que se recebiam quando morria alguém.
    Vinha amolar facas e tesouras, reparava relogios cansados e agrafava bocados de vasilhas que o tempo tinha escoicinhado.
    E o tacho da avó tão velhinho quanto ela agrafava-se com rebites de fazer ciumes ao Titanic.
    E o tacho rodava mais umas batatas cozidas com um naco de toucinho.
    O Titanic dormia o sono dos justos nas profundezas do oceano coberto pelas ondas agrafadas dos temporais.
    O amolador depois de tudo amolado e com meia duzia de tostões lá se ia rua abaixo de encontro a outro tempo.
    O Ti Zé amolador agrafava as ultimas decadas do seculo vinte.
    Hoje que não temos tempo, também não temos agrafos, nem batatas cozidas com toucinho …
    

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  2. Raquel

    Hoje foi uma manha e tanto…. o que esperei para o conhecer um pouquinho melhor…. lembro me de si a apresentar um programa de culinaria “Sebastião come tudo”…. era eu uma criança.
    Para lhe dizer que admiro o muito. Tem uma cultura solida e estruturada, é o melhor apresentador da actualidade é sem dúvida um grande homem e sobretudo faz me alegrar os dias….. sim porque o MLG e a Cristina Ferreira num dia de Março fizeram me sorrir depois de ter perdido a minha filha ainda dentro do meu ventre…..
    Nunca o vi pessoalmente mas considero o como um membro da familia pois o MLG como produto televisivo é de excelência mas tem mais e da muito mais que isso nos 5 dias na semana….
    Obrigado pela companhia que espero que dure até querer.
    Um dia havemo nos de encontrar e ai direi sem pretenciosismo algum o quanto o admiro.

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  3. Carla

    Manuel
    Muito original, a minha avó também tem peças com gatos.
    Gostei de conhecer o espaço onde a colocou, parece-me que preservou o lavatório do monte , preservar o antigo é dar continuidade à história.

    Caso vá para o monte boa viagem, desfrute do Poejo, Dolly e toda a sua bicharada está no Edén não do pecado, da felicidade, da celebração da vida.

    “O Ser do homem não pode ser compreendido sem a sua loucura, assim como não seria o ser do homem se não trouxesse em si a loucura como limite de sua liberdade.”
    Lacan

    Vivam todos aqueles que nos ajudam a despertar, a olhar a vida como ela deve ser vivida. O Manuel é um livre pensador, gostei muito do que disse ontem, concordo. Os homens não estão habituados a ser abandonados pelas mulheres…

    Continue a abrir mentes, a tirar grilhões.

    Abraço aos 2
    Carla

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  4. Raquel Silva

    Que engraçado, uma simples taça sem valor algum, segundo as suas palavras falam tanto. Acho-a linda e faz-me recordar alguidares de barro com os gatos, levou-me à infância, tem graça.
    Esta taça se falasse teria muita coisa para contar, continua linda, e o que é certo é que ela depois de velhinha e gateada estar na casa de sonho do Manel.

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  5. Pilar

    Boa noite,

    Passo frequentemente por esta sua -e permita-me- e tambem nossa casa, mas, timidamente apenas observo o que tão generosamente partilha…
    Agradeço-lhe esta publicação, fez-me lembrar de tantas memórias… cheiros, sons, sentimentos….
    Lembro-me exactamente do sítio onde, dando a mão à minha querida avó, íamos té ao carrinho do amolador com as tesouras da costura.
    Fantástico. Obrigada. Muito obrigada.

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  6. Maria Silva

    Olá Manel

    Vivo em Coimbra no Bairro Norton de Matos onde sou muito feliz, e ainda hoje de quando em vez, lá se ouve a gaita cujo o som me transporta para outros cheiros e outros sabores, adorei a forma como reciclou esta taça. Também sou uma fã de velharias!

    Obrigada

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  7. Maria de Fátima Ferreira Martins Salvado

    Sr. Manuel Luis Goucha
    Amei a taça grampeada.
    Ao contrário de todos o som da gaita do amolador de facas, nem sei bem porquê , transmite-me uma mágoa terrível e uma profunda dor no meu coração que demora a passar.
    Um dia ainda gostava de saber o motivo desta reação.
    Para si as maiores vitórias. Acompanho-o desde que me lembro de “ser gente”.
    Cumprimentos.
    Maria de Fátima

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  8. Ana Maria zica

    O Manuel , vai buscar coisas , que também lembram minha infância …afinal somos da mesma idade !
    Lembro perfeitamente , loiça de estimação e não só …hoje tem- se tudo ,mas há 50 anos ,as peças de loiça eram escassas .
    Moral da história : mesmo velhas ,as coisas têm sempre um serventuário ( está foi à alentejana) kkk .

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  9. Ana Maria zica

    O Manuel , também me transportou, para minha infância …afinal, somos da mesma idade .
    Moral da história…coisas velhas , com ou sem gatos , tem utilidade !

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  10. Fernanda Maria

    O som do amolador a chegar. Não há música que me transporte no tempo e no espaço como a que toca a gaita do amolador.
    Grata pela lembrança.

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  11. ana dias

    Meu querido Manuel Goucha !!! sim, querido porque gosto de si, se assim não fosse não entraria tantas vezes na minha casa… eu acho que as suas casas devem ser super giras … consegue dar brilho as coisas … que lindas ficam as toalhas … mostre mais coisas giras , por servem – me de inspiração. obrigada bjo

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    1. MLG

      Olá Ana Dias
      Claro que acho que as minhas casas são giras porque estão decoradas por mim e a meu gosto.
      Sinto-me bem nelas se bem que no monte tenha optado por um rústico confortável por achar que não devia atraiçoar
      a memória da casa. Depois por estas bandas em feiras e antiquários há um número sem fim de peças que podem ganhar nova vida. Gosto de decorar. Um beijo

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  12. Olivia Bento

    Caro Manuel Luis,
    Quase que era uma metáfora, mas efectivamente não é, mas sim uma maneira de reciclar uma peça de cerâmica ou barro partida.
    Sou natural da Chamusca ( Carregueira) onde antigamente se amolava facas, tesouras, pingo em baldes de zinco, “gatos” nos pratos. Estas actividades eram de desenvolvimento sustentável.
    Gostei da maneira original de colocar as toalhas das mãos dentro da tijela gateada.
    Desejo-lhe um ótimo fim de semana.
    Um abraço
    Olivia

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  13. Isaurinda Relvas

    Na aldeia onde vivo, também Alentejo, ainda passa de vez em quando o amola tesouras, como é chamado aqui. E ninguém fica indiferente àquele som tão característico da “gaita” que vai soprando. O mais curioso é que nestas bandas ainda se acredita na crença que depois do amola tesouras passar certamente que a chuva acabará por cair nestas terras secas e áridas o fim de três dias. Acaso ou não, o certo é que muitas vezes eu pude constatar tal veracidade. Beijinhos e continuem a descobrir esta terra de encantos…..

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  14. isabel baptista

    Manuel eu connheco bem esses gatos , e qual nao e o meu espanto aqui na Inglaterra encontrei uma travessa bem antiga e com gatos , pos nao serve para nada mas e uma peca bem linda

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  15. rosalina monteiro

    É uma pessoa curiosa e sabe puxar a nossa curiosidade Grande Sr ,grande comunicador e apuradissimo no gosto e no trato Lembri me do seu comečo Que bem soube crescer em idade e qualidade Tal a qual “o vinho do Porto”

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  16. Catarina Duro

    Colocada com classe , fica bem em qualquer espaço !! Tenho pena de não ter mais peças com os gatos…..porem a minha tia deitava tudo fora! Resto de boas férias.

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  17. Romy

    ADOREIIII…. Tenho uma bacia que era da avó do meu marido que também tem gatos e uma travessa grande que era da minha avó paterna que também foi reparada com o mesmo método,estão na minha casa em Portugal porque eu vivo fora do país.
    Conheço pouco do Alentejo,no princípio do ano passei 6 semanas aí Portugal,with soy da Bairrada e decidimos ir passear para o sul,passamos o Carnaval em Loulé,na volta viemos para casa pela margem do Guadiana,dormimos em Moura num hotel que já foi hospital,adorei e falo nesse hotel a todos os nossos amigos,quero voltar com mais tempo e visitar mais o Alentejo.
    Desculpe este comentário tão comprido.
    Cumprimentos,muita saúde para puder desfrutar desse sonho.
    Romy dos States

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  18. Antonia Ramalho

    Ola Manel, tenho algumas peças de loiça “gatadas” que eram da minha Avo. Pessoalmente não aprecio muito, mas tenho-as ate a vista em moveis e paredes. Deixe que lhe diga que a sua casa de banho tem mesmo cara de monte. Não quero tomar-lhe mais tempo, o seu tempo de ferias esta a queimar os ultimos cartuchos ,por isso despeço-me com um beijinho e votos de boa noite.

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  19. Rosa Manuela

    Final feliz para a essa velha taça ,decorar a casa do Manuel Luís Goucha ,não é para qualquer peça ,acredito agora que passe mesmo a antiguidade e de luxo adorei ……

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  20. Sameiro Vieira

    Olá Manuel Luis
    Boa noite
    Ao ler sobre isto fez me lembrar algumas peças que a minha avó tinha, pois como diz naquele tempo não se podia deitar nada fora.
    E para durar mais algum tempo faziam isso.Eu nasci aqui em Viana do Castelo mas aos 4 anos os meus pais foram para o Porto ,mas todos os anos vinha cá passar ferias ,lembro me de ver um senhor que passava para compor louça, afiar tesouras, e guarda chuvas. Lembro me que tomava café em xavenas assim como tinha pratos também com agrafos. Lembro me que o prato era uma louça que chamavam cavalinho azul . Por sinal tenho muita pena não ter uma peça dessas para recordação. Gostei da sua ideia de ter dado um novo préstimo a essa peça. Gosto ler os artigos que escreve…Um abraço e até breve

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    1. Ana Maria zica

      Olá Manuel …você está me trazendo à memória , coisas, que com o passar dos anos , já me tinha esquecido ! Lembro perfeitamente , desses gatos , numa plengana ( tigela grande) que a minha mãe tinha kkkk !
      Muito bom , o Manuel é único .!!! Amei!!! conheço tudo de que falou .

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